Implementações tecnológicas na ciência

A cada dia, verificamos novas introduções tecnológicas nas mais diversas áreas da ciência. Países e organizações – públicas e privadas – investem cada vez mais em pesquisa, desenvolvimento e busca por novas tecnologias. O número de novas descobertas e patentes cresce em patamares jamais vistos.

O mesmo acontece com as telecomunicações, em todas as suas vertentes: voz ou dados, cabeadas ou por meio de ondas eletromagnéticas, a curtas ou longas distâncias. Hoje, já é possível, em grandes centros urbanos, conectividade quase que total, com a possibilidade de troca de mensagens praticamente instantâneas, em alcance mundial. Usuários em diferentes cidades ao longo de nosso planeta, seja Pequim ou Tóquio, na Ásia, Paris ou Roma, na Europa, Dakar ou Pretória, na África, Lima ou São Paulo, na América do Sul, podem conversar, inclusive por vídeo, ou trocar mensagens de dados, de forma segura e em altas taxas.

Diversas são as razões para tamanho desenvolvimento.

Podemos citar algumas:

– O desenvolvimento de componentes eletrônicos, cada vez mais miniaturizados, com maior capacidade de processamento, maior robustez e confiabilidade;

– O desenvolvimento de algoritmos, modulações e técnicas de comunicações cada vez mais sofisticadas; no começo do século passado, a modulação AM (amplitude modulada) era a base das comunicações via rádio. A modulação FM (frequência modulada) introduziu novos benefícios. Nos dias de hoje, além de modulações digitais mais complexas, como QAM (Quadrutura Amplitude Modulation) tem-se também as novas técnicas de modulações por espalhamento espectral (sequência direta e salto em frequência) e códigos de correção de erros, esses últimos desenvolvidos para possibilitar as comunicações por ocasião da exploração do espaço profundo; e

– O desenvolvimento da capacidade de comunicação em redes, ou seja, por meio de caminhos diferentes, em técnica denominada “diversidade espacial”, quando o sistema se ajusta de forma dinâmica a procura sempre o “melhor” caminho – o caminho otimizado. Assim é a base para a utilização dos roteadores, dispositivos indispensáveis para as rápidas comunicações de dados em altíssimas taxas. Salienta-se que as comunicações em redes também proporcionam resiliência às comunicações, pois o sistema procura alternativas na eventualidade de um caminho estar interrompido.

A internet, a comunicação satelital, as fibras ópticas mergulhadas sobre o fundo dos oceanos e as comunicações por meio de telefonia celular são exemplos de novas tecnologias e modernas técnicas de comunicação desenvolvidas nas últimas décadas.

Com relação à comunicação em redes, verifica-se que possíveis razões de falhas por parte de sua arquitetura podem ser devidas a algum mau funcionamento eventual de seus componentes ou desastres da natureza. Entretanto, no mundo atual, há que se considerar também os possíveis ataques cibernéticos, que podem ser executados por forças militares ou até mesmo terroristas, em conflitos convencionais ou assimétricos.

De qualquer forma, independentemente da motivação para a falha da rede, deve-se elaborar estratégias para mitigá-las, quando ocorrerem. A questão a ser formulada não é se ocorrerão, mas quando ocorrerão.

A Collins Aerospace, tradicional empresa estadunidense na área de Defesa e com amplo portfólio, notadamente na área de comunicações seguras, desenvolveu o sistema HF Celular, que, de forma resumida, proporciona a um usuário móvel, independentemente de sua localização, a escolha da melhor frequência de operação – por meio de técnica de diversidade de frequência – e da melhor estação de conexão – por meio de técnica de diversidade espacial – proporcionando assim o estabelecimento de conexão de forma rápida e eficiente.

Para tanto, o HF Celular faz uso da porção do espectro eletromagnético na faixa de HF (3 a 30 MHz), onde a onda eletromagnética, após ser transmitida, atinge a ionosfera e sofre um processo de refração contínua e, de forma similar a uma reflexão, retorna à superfície do planeta. Esse processo de comunicação é dependente de diversos fatores, alguns sob controle, tais como a localização do transmissor e do receptor, tipos de antenas utilizadas, potência dos equipamentos rádios; outros fatores, contudo, como sun spot number (número de manchas solares), altura da camada e formação da ionosfera, todos dependentes da irradiação solar, não podem ser controlados pelo ser humano – no máximo monitorados.

Esse mecanismo de propagação na faixa de HF, não observado em outras faixas de frequência, é utilizado para comunicações com aeronaves em voos intercontinentais, navios longe da costa e por radares Over the Horizon (OTH), para detecção além do horizonte.

Ressalta-se, contudo, que os mecanismos de propagação ionosférica são complexos, e nunca foi fácil antever seu desempenho; ao se tentar prever, por exemplo, qual a melhor frequência de operação para determinado momento e dada localização do transmissor e do receptor. Em passado não muito distante, se fazia uso dos mapas Maximum Usable Frequency (MUF), que, em geral, não proviam resultados satisfatórios e tornavam a operação muito dependente das experiências dos operadores. Pior ainda, a situação em países próximos à Linha do Equador, devido às anomalias equatoriais.

Mais recentemente, foi desenvolvido o protocolo Automatic Link Establishment (ALE), onde a unidade transmissora e a receptora realizam rápido protocolo antes de se iniciar a comunicação propriamente dita, de forma a se escolher a melhor frequência de operação para aquelas circunstâncias. A introdução do protocolo ALE nas comunicações em HF proporcionou substancial melhoria da qualidade das mesmas, mas não resolveu definitivamente o problema.

A introdução pela empresa Collins Aerospace, do HF Celular, proporcionou uma mudança de paradigma nas comunicações em HF, conforme explicado a seguir.

Descrição do hf celular

No HF Celular, verifica-se a existência de um conjunto de estações terrestres, integradas em rede por meio de um servidor, onde a entrada da unidade móvel à rede se dá pela estação que proporciona melhor cobertura. Consiste, portanto, de um backbone de comunicações, instalado em sítios terrestres, criando um “guarda-chuva” eletromagnético na área de cobertura de interesse.

A operação em rede possibilita alta probabilidade de estabelecimento de comunicação na primeira tentativa, tipicamente acima de 90%. Pode operar com rádios móveis de qualquer fabricante, desde que disponham do protocolo ALE 2G (ALE de segunda geração), preservando, portanto, o investimento anteriormente feito. Os rádios móveis podem ser instalados em aeronaves, embarcações, viaturas ou serem do tipo manpack.

O HF Celular pode contribuir também para as atividades de Comando e Controle, pois informações de posicionamento GPS podem ser repassadas por meio dos rádios móveis, de forma automática, aos centros de Comando e Controle. A informação de posição, se repassada, pode ser criptografada, como explicado mais abaixo, de forma a preservar o sigilo da operação. A foto abaixo ilustra esse processo, em demonstração executada pela Collins Aerospace na Amazônia. Pode-se verificar o acompanhamento de posição da unidade móvel, entre as cidades de Tabatinga e Benjamin Constant.
ossibilita também o uso de criptografia para garantir o sigilo das comunicações, e vocoder tipo MELP-e (Mixed-excitation linear prediction-enhanced), melhorando substancialmente a qualidade das comunicações. Importante ressaltar, essa unidade pode ser utilizada com rádios de outros fabricantes, desde que os mesmos possuam conectores de entrada e saída de áudio.

O conceito de operação do HF Celular é similar ao da telefonia celular móvel, quando um usuário móvel é conectado à ERB – Estação Rádio Base – na qual se estabeleça a melhor conexão, e não necessariamente a mais próxima. Há, contudo, uma importante diferença: na rede de telefonia móvel, devido à faixa de frequência utilizada, a comunicação se dá em visada direta, ao passo que em HF poderá ocorrer de haver múltiplas reflexões na ionosfera, fazendo com que a conexão ocorra de forma ainda mais sofisticada.

O triângulo das comunicações em hf

O triângulo abaixo ilustra as três principais fases das comunicações em HF. Na base do triângulo, tem-se as comunicações em HF tradicionais, sem operação em rede e sem utilização do protocolo ALE. É a forma antiga de se comunicar em HF e muito ineficiente. A probabilidade de conexão na primeira tentativa é estimada em torno de 20%.

Na parte intermediária do triângulo, tem-se a introdução do ALE, mas ainda sem operação em rede. A unidade móvel (aeronave, embarcação, viatura, manpack etc) conecta-se à estação fixa previamente definida, de forma estática. Caso ela se desloque para área de atuação de outra estação fixa, há que se estabelecer processo manual de coordenação, podendo sempre estar suscetível às dificuldades de comunicações, coordenação e controle. A probabilidade de conexão na primeira tentativa é estimada em torno de 60%.

Na parte superior do triângulo, tem-se o HF Celular, onde a unidade móvel se conecta à estação fixa com melhor qualidade de sinal, independente da distância. Em caso de deslocamento da unidade móvel, não há necessidade de coordenação, que é feita de forma automática e transparente para os operadores. Mecanismo similar ocorre quando usamos o telefone celular em um carro se movimentando. Nosso aparelho é constantemente reconectado a outras ERBs, de forma automática, sem que sequer nos apercebamos. É o chamado handoff. Em uma rede adequadamente dimensionada, a probabilidade de conexão na primeira tentativa é estimada acima de 95%.

Além do rápido estabelecimento de comunicação, o HF Celular apresenta como vantagem adicional sua maior resistência a falhas. Em caso de inoperância de uma das estações fixas, as demais estações assumem seu papel, sendo eventual degradação gradual, e nunca total, como no caso dos sistemas que não operam em rede.
Triângulo que representa a evolução das comunicações em HF. Na sua base, as comunicações em HF clássica, que apresenta várias dificuldades para estabelecer conexão; ao centro está a introdução do ALE (Automatic Link Establishment), uma tecnologia usada por várias empresas, incluindo a Collins, onde se escolhe a melhor frequência antes de se estabelecer a comunicação propriamente dita; acima, o HF Celular, com sua operação em rede, e que oferece benefícios não disponíveis por outras soluções.

Comparação de operação de rede tradicional e hf celular para a marinha do Вrasil

À esquerda, uma rede tradicional, na qual as diferentes estações não são integradas a uma rede, e cada estação procura cobrir uma determinada área, mesmo que as condições de propagação sejam desfavoráveis.

À direita, uma rede de HF Celular, interconectada em rede, onde a comunicação da unidade móvel (avião, veículo, navio, etc.) é realizada com a estação fixa onde são encontradas as melhores condições de propagação, independentemente da distância entre a unidade móvel e a estação fixa.

Esse processo de integração das estações fixas na rede, fornecendo um backbone de alta frequência em uma grande extensão territorial, como se fosse um grande guarda-chuva, mostra-se mais eficiente, reduzindo significativamente o tempo de conexão entre a unidade móvel e a estação fixa com condições mais adequadas para esse momento.

É importante observar que a conexão entre a unidade móvel e a estação fixa pode ser constantemente redefinida, como resultado da busca constante e automática da melhor conexão, independente do desempenho do operador.

Conclusões

A operação em rede proporcionada pelo HF Celular, juntamente com a utilização do protocolo ALE, onde se escolhe a melhor frequência de operação, confere à solução desenvolvida pela empresa Collins Aerospace técnicas de diversidade espacial e em frequência, respectivamente.

O HF Celular representa o estado da arte, no que diz respeito às comunicações em HF e pode ser implantado de forma gradual, sendo totalmente escalável. A possibilidade de utilização de rádios móveis de diversos fabricantes diminui consideravelmente os custos de sua implantação.

Diante de tudo que foi apresentado, o conceito de HF celular se apresenta como uma opção que disponibilizaria um grande ganho operacional no que tange às comunicações em HF, seja voz ou dados, principalmente para navios que devam operar distante da costa, sendo particularmente útil em lugares nos quais existam regiões desassistidas de infraestrutura de comunicações, como é o caso do interior da Amazônia por exemplo, no qual a acessibilidade somente é realizada por meio de embarcações se utilizando de toda malha de rios existentes.

Para a MB, o sistema poderia trazer grandes benefícios. Mantendo-se a atual estrutura do Sistemas de Comunicações, com uma Estação Rádio em cada Distrito Naval, os navios de superfície e fluviais seriam atendidos pela Estação que apresente melhor conexão. Por exemplo, um navio a 200 milhas de Salvador não precisaria obrigatoriamente se conectar à ERMS, mas poderia fazê-lo à ERMB ou ERMRJ, dependendo do melhor “caminho” – com melhores condições de propagação. Alternativamente, um NaPaFlu navegando no Rio Amazonas poderia se conectar à ERMN, por exemplo, mesmo sendo a ERMBe a mais próxima. Os ganhos operativos são enormes. Tudo de forma automática e sem ação de operadores. Adicionalmente, o sistema pode ser operado remotamente, e as Estações Rádio poderiam ser guarnecidas com menos operadores.

As demonstrações executas pela Collins Aerospace para a Marinha do Brasil, em passado recente, puderam demonstrar a robustez da solução e a rápida conexão das unidades móveis às Estações Rádio, em função da operação em rede intrínseca e exclusiva do HF Celular.

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