O estudo apontou que não há um consenso sobre o que seja de fato democratização da educação superior. Para Ristoff (2008, p. 45) a democratização da educação superior está associada a ampliação da oferta de vagas em universidades públicas, inclusive no período noturno; a inclusão de “milhares de jovens de classe baixa, pobres, filhos da classe trabalhadora e estudantes das escolas públicas”; e a garantias de permanência material. Já Paula e Silva (2012) defendem que:[…] a ênfase na política de expansão e massificação não esgota o projeto de democratização da educação superior. Esse processo só se completará se tivermos igual proporção de crescimento na taxa de concluintes, com integração crescente das camadas marginalizadas socialmente, sobretudo dos estudantes de baixa renda. É necessário visar com igual ênfase o final do processo: a conclusão, com êxito, dos cursos superiores, integrando nesses índices as camadas subalternizadas da população, com garantia de qualidade na formação. A vigilância constante sobre a qualidade dos cursos de graduação, as taxas de conclusão e o perfil socioeconômico dos concluintes e dos que evadem nos parece essencial, não apenas para atestar ou não o sucesso do processo como para produzir feedbacks sobre as políticas adotadas .
Nestes termos, faz-se necessário apresentar as políticas de ampliação do acesso/inclusão na educação superior implementadas no Brasil, sobretudo no início do século XXI, bem como compreender se tais políticas foram acompanhadas de ações governamentais ou institucionais de programas de promoção da permanência e conclusão dos estudos.
Ampliação do acesso e inclusão na educação superior brasileiraEstudos apontam que a ampliação de vagas e matrículas na educação superior, desencadeadas desde os anos de 1960 e intensificadas na década de 1990, por meio de instituições privadas não visava atender notadamente a demanda de discentes oriundos de escolas públicas , negros, pardos e mulheres na educação superior; haja vista que não existiam políticas educacionais específicas para contemplar esses públicos.
Gisi (2006) e Ristoff (2008) chamam atenção para a inconsistência da política de ampliação de vagas por meio de instituições privadas que foram incentivadas pelo governo brasileiro, sobretudo na década de 1990, como forma de democratizar o acesso à educação superior. Isto porque, nesse contexto, houve um aumento significativo do quantitativo de vagas nas instituições privadas, mas um número elevado delas estava desocupado devido a evasão ou ociosidade, o que era resultado, em parte, da dificuldade dos jovens e de suas famílias pagarem mensalidades.
Vagas na educação superior no Brasil
Em 2004, do total de vagas disponíveis na educação superior (2.320.421), apenas 1.303.110 (56,2%) foram preenchidas, permanecendo ociosas 1.017.311 vagas (43,8%). Em 2003, pela primeira vez na história da República, o número de vagas na educação superior superou o número de concluintes do ensino médio .
Por outro lado, como as vagas ofertadas pelas universidades públicas eram em número reduzido e como os alunos oriundos de escolas públicas, negros, pardos e mulheres, geralmente, frequentaram escolas públicas com baixa qualidade de ensino, apresentavam capital cultural inferior aos dos alunos provenientes de escolas privadas, que também tinham acesso a outros bens econômicos, sociais e culturais; assim, segundo a autora, os discentes aprovados eram, em maioria, brancos, de maior poder aquisitivo e que tiveram acesso à educação básica de qualidade. Essa desigualdade ao longo da trajetória escolar e de vida, determinava o acesso ou não (hoje ainda determina, embora que menos) ao ensino superior, bem como interferia (hoje ainda interfere, embora que menos) na escolha da instituição, do curso e até do turno que o discente iria frequentar .
Diante da percepção do caráter desigual no acesso à educação superior houve, segundo Heringer , a partir de 1990, mobilizações de diversos segmentos sociais, sobretudo do movimento negro, bem como de atores políticos em prol da expansão e democratização do acesso à educação superior pública no Brasil. Neste contexto, um outro fator que impulsionou a demanda pela expansão e democratização do acesso à educação superior, foi o aumento no número de concluintes do ensino médio.
A partir de 2003, com a mudança de Governo no âmbito federal, deu-se continuidade a expansão no setor privado, com incentivo direto do poder público. As políticas de ampliação do acesso via setor privado tinham como objetivo assegurar a permanência do estudante oriundos das camadas sociais mais pobres, ao conceder bolsas de estudo, parcial ou integral, através Programa Universidade para Todos , bem como crédito educativo com taxa de juros reduzidas, via Fundo de Financiamento Estudantil .
Merece destacar que, neste contexto, houve a implementação de políticas para ampliar a estrutura do setor público, o que contribuiu para romper, em certa medida, com a lógica privatista dos governos neoliberais da década de 1990. Isto porque, a partir de 2003, o governo federal estimulou a criação de universidades, campi, cursos e propôs a execução do Programa REUNI; que oportunizaram a ampliação no número de cursos, vagas e matrículas em universidades federais .
A consulta aos websites das 18 universidades federais, criadas entre 2003 e 2014, permitiu constatar que 17 delas têm campus ou reitoria em cidades do interior do país. A Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre é exceção a essa regra porque dispõe de apenas um campus, que está situado em Porto Alegre, capital do estado do Rio Grande do Sul.
Cabe pontuar que o Programa REUNI não se limitou a ampliação de vagas nas universidades públicas federais, houve uma orientação para que o aumento de vagas ocorresse, especialmente no período noturno, de modo a possibilitar o aproveitamento do espaço ocioso no período da noite e o ingresso e permanência de jovens trabalhadores nas universidades públicas federais. Ademais, este programa sinalizava a necessidade de reduzir a taxa de evasão, demonstrava preocupação com a permanência material dos discentes e com a ampliação da inclusão . No entanto, é válido frisar que a política de inclusão social e étnico-racial foi implementada por meio da Lei 12.711/2012, denominada de Lei de Cotas .