Quando falamos a respeito da atuação de mulheres que possuem um reconhecido papel histórico e político, suas representações podem ser marcadas por narrativas, nas quais o papel feminino é reduzido ou posto em participações coadjuvantes. Nesses casos, desprovidos de qualquer complexidade, as memórias femininas podem não fazer justiça às suas participações históricas. Este parece ter sido o caso de Dona Carolina Josefa Leopoldina Francisca Fernanda de Habsburgo-Lorena, figura central no processo de Independência do Brasil. Pedro. Sua imagem, em muitas circunstâncias, ficou reduzida tanto no imaginário popular ou até mesmo pela historiografia, como mulher “apagada”, “pouco atraente” e esposa “traída”.
Contudo, nos últimos anos, em grande parte devido a abertura promovida pela escola de Annales, que foi um movimento de renovação historiográfica, ocorreram mudanças que passaram a dar voz a essas personagens. É neste contexto que se insere o presente projeto, que tem o objetivo de resgatar, por meio de uma revisão bibliográfica a representação de Leopoldina para além dos estereótipos. Buscando identificar o seu papel como liderança em projetos de impulsos ao desenvolvimento da ciência, da cultura e de outras atividades e sua contribuição para formação do povo da sociedade brasileira.
Еxemplos da literatura
Desde quando chegou ao Brasil em 1817, até a sua morte, no final de 1826, Leopoldina foi de arquiduquesa da Áustria, princesa do Reino de Portugal, até, finalmente, imperatriz do Brasil. Todo processo foi acompanhado de muitas expectativas sobre a jovem austríaca. As cartas que Leopoldina escreveu para sua família – uma vasta correspondência, nos dá uma certa dimensão histórica de seu caráter, e dos papeis que desempenhou enquanto mulher, princesa, e imperatriz do Brasil. Nesse sentido, cabe também refletir em que medida suas manifestações afetivas podem ter contribuído para formação do imaginário existente em torno da figura de Leopoldina.
Como de tantas outras mulheres na historiografiateve sua história reduzida. Um exemplo disso, é exposto pela pesquisadora ao mostrar que nas narrativas históricas sobre a independência do Brasil, emprestam contornos tendenciosos. É mostrado uma imagem de D. Pedro I como “herói” da Independência, enquanto D. Leopoldina apenas como a “esposa feia de D. Pedro I”, que em nada contribuiu para o processo de emancipação política brasileira. De acordo com o historiador Oberacker Júnior:
D. Leopoldina sacrificava-se conscientemente a uma causa que não era a dos seus ascendentes; aceitava corajosamente a ideologia americana que não era a sua, e embora pressentisse que jamais retornaria à Europa, acompanha D. Pedro, trabalha para ele e para o Brasil, aceita a ingerência dos negócios políticos – ela que os detestava; fiscaliza as forças da Independência que ela reconheceu inevitável e que abraça mais depressa do que o príncipe […] e prova, afinal, a sua devoção pelo Brasil e o grande heroísmo de sua dedicação por D. Pedro
No entanto, ainda é possível perceber que em diversos livros de história, filmes, reportagens, costumam enfatizar os aspectos físicos de Leopoldina, em detrimento de sua participação da independência do Brasil. Por exemplo, na obra do historiador Francisco Adolfo de Varnhagen, ao narrar o episódio de independência do Brasil, destina a Leopoldina apenas o papel de uma boa esposa.
Já se despediu quase resolvido a declarar a Independência, segundo se vê da seguinte circular passada por José Bonifácio nesse dia ao corpo diplomático, comunicando-lhe o manifesto: – “Tendo o Brasil, que se considera tão livre como o reino de Portugal, sacudido o jugo da sujeição e inferioridade com que o reino irmão o pretendia escravizar, e passando a proclamar solenemente a sua Independência
Essa desvalorização da imperatriz pela historiografia brasileira, ao lado de sua figura marcante como mulher participativa, em muito contribuiu para a escolha desse objetivo de pesquisa.
Acreditamos que Leopoldina foi vista com certo preconceito na escrita da história por possuir uma cultura e educação diferentes dos portugueses.