Grandes acidentes são relevantes problemas sociais, uma vez que podem afetar pilares importantes das sociedades contemporâneas, como as populações, as infraestruturas e as próprias organizações onde ocorrem. Eles são normalmente oriundos de organizações de alto-risco, onde interagem aspectos de natureza técnica, social e organizacional.
São eventos que alcançam uma situação limite, subsidiando acontecimentos capazes de alterar a formulação de agenda de um campo e acelerar a mobilização em torno de si. Correspondendo a esses aspectos, temos o grande incêndio industrial na empresa Ultracargo, em 2015, no Porto de Santos.
Com início por volta das 10:00 horas no dia 02 de abril de 2015, o incêndio começou em um tanque de combustível industrial com capacidade para armazenar seis milhões de litros. Ao longo das 192 horas de duração, o fogo atingiu outros cinco tanques de mesma capacidade, sendo ao total quatro de gasolina e dois de etanol.
Foram disponibilizados em média cem trabalhadores do corpo de bombeiro e 21 viaturas, tendo alguns trabalhado por até quarenta e duas horas sem descanso, e 15 necessitaram de atendimento médico. Mesmo sem vítimas fatais, foi o maior incêndio em duração do estado de São Paulo e o segundo maior da história mundial em volume de pessoas destacadas para combater o fogo.
O laudo oficial do Ministério Público Estadual – MPE, concluiu que a causa foi a ruptura de uma bomba de transferência de combustível, causada por ‘BLEVE – Boiling Liquid Expanding Vapor Explosion, a expansão do líquido em ebulição e explosão do vapor, liberando combustível em autoignição. A bomba não estava em operação e foi ativada com as válvulas fechadas, equivoco caracterizado como falha operacional pelos técnicos.
Desenvolvimento de estratégias
Compreender esses acidentes em sistemas tecnológicos complexos pode resultar no desenvolvimento de estratégias de gerenciamento de riscos mais adequadas, onde aspectos sociais e qualitativos devem ser introduzidos na análise de causas. E foi através do uso de teorias como: acidentes normais (NAT), de organizações de alta fiabilidade (HRO) e a sociedade de risco; que aspectos qualitativos ganharam contribuições na análise de desastres e riscos. Essas teorias fundamentam a análise desse estudo sobre o incêndio industrial citado.
A teoria das organizações de alta fiabilidade, ou High Reliability Organizations – HRO, é embasada pela capacidade resiliente das organizações, sendo essa a capacidade que elas detêm para absorver ou incorporar mudanças sem que originem efeitos adversos ou falhas catastróficas. É uma capacidade sistémica de ajustamento funcional que permite enfrentar situações novas, e significa que as organizações podem eventualmente sofrer determinadas falhas (pressões, distúrbios ou disfunções), sem que esses eventos conduzam necessariamente a acidentes graves ou a efeitos indesejados.
Porém, é pertinente referir que essa resiliência (elasticidade) não é infinita, mas pode acomodar determinadas situações sem provocar danos ou perdas, pelo menos até um dado limite . A HRO visa aumentar o aspecto de controlabilidade dos processos das corporações, apresentando diretrizes burocráticas baseadas em atingir metas e objetivos de segurança; controle hierárquico que garanta treinamento aos profissionais em situações emergenciais; formas de relatar os erros, falhas e lapsos que melhorem a aprendizagem organizacional e, sobretudo, aplicar formas sistêmicas de redundância nos múltiplos componentes, para garantir variadas visões que otimizem o funcionamento e diminua os acidentes.