Segundo Souza (2019), a vila era abastecida pelas fontes que cercavam o território, a exemplo da Fonte do Cavalo, a Fonte da Quarta, a Fonte do Caminho e a Fonte do Landir e pelas reservas de água mineral. Antes de retirar a água, a fonte era lavada e só após encher novamente as calhas, eram então abastecidas, o que tornava a ação um longo ritual que envolvia diversas pessoas, ocupando uma parte significativa do tempo.
A comunidade é por sua vez uma unidade social, que conserva e reinventa práticas tradicionais sobre ecologia, biologia e geografia que constituem tanto a identidade como a subjetividade de seus membros. Por estar inserida em uma das áreas mais antigas do Estado da Bahia a relação homem-ambiente remonta a atividades adquiridas de seus ancestrais, reiterando as espacialidades desenvolvidas pelos habitantes que ali se encontravam: pesca artesanal, a mariscagem através do manejo sustentável dos recursos pesqueiros, a plantação de subsistência, além de contar com a produção de cal resultante da queima de ostras. Risério (2004) descreve o modo de formação do lixo ameríndio construído ao longo da baía, narrando a ação dos índios mariscadores, comedores de moluscos e o acúmulo de restos alimentares e detritos objetais num mesmo ponto, originando dessa forma os sambaquis, que, ao serem queimados, transformavam-se em cal para a engenharia lusitana, utilizado nos primeiros monumentos e fortificações erguidas na colônia. Essa prática permaneceu viva por décadas na vila, a ponto de ter uma ilha cujo nome rememora a produção de cal, sendo então denominada Ilha do Cal, em referência a sua maior atividade desenvolvida. Hoje, sob concessão privada, abriga em suas terras uma casa em estilo nórdico, reconhecida como castelo pela comunidade de Matarandiba, chegando até ela através de uma tubulação enterrada no mar, bombeada por uma casa de máquinas de sua propriedade localizada na região do porto.
A proximidade de Matarandiba ao Recôncavo Baiano favoreceu por muito tempo as transações econômicas e culturais estabelecidas pela vila, tendo em vista a movimentação de barcos pela rota dos saveiros que circulavam entre os rios e a baía. Esse tipo de embarcação adequado para as condições marítimas da região foi muito utilizado para promover a comunicação entre as diversas vilas existentes, favorecendo a troca de mercadorias, saberes, ritos e pessoas. As embarcações possuíam uma função econômico-cultural de caráter sustentável, marcando profundamente o cenário comercial de sua época, carregando produtos como peixe, farinha, azeite de dendê, caranguejo, mariscos secos e outros, prontos para serem negociados em mercados das cidades às margens da baía, incluindo também sua capital.
“Antigamente se fazia um barco grande, um barco enorme, cortado no machado, que pegava mil sacos. Meu avô fazia cada barco bonito. Pegava 800 sacos de café que vinham no saco de alinhar e levavam pra Salvador. Trabalhava de dia pra comer de noite e de noite pra comer de dia. Meu pai era pescador, tinha um saveiro só pra levar peixe pra Salvador”. (Agenor, 79 anos, 07/2009).
A vida desses homens do mar nunca foi fácil, sendo marcada pela incessante luta pela sobrevivência, onde o mar que era seu maior empregador também lhes apresentava a condição de liberdade. Sua população esteve sempre ligada a ele, desempenhando papel de estivadores, marinheiros, pescadores/as, saveiristas, também impulsionados pela arquitetura popular naval praticada pela comunidade na construção de canoas e saveiros do antigo estaleiro que havia na ilha favorecido pela diversidade de árvores de grande porte existentes na Floresta Atlântica. Essa variedade de vegetação tornava favorável a construção de embarcações que atingindo uma dimensão socioespacial territorial, desempenhava também um papel econômico-cultural expresso na diversidade das atividades. Esses barcos utilizados para o transporte de carga necessitavam de pouca tecnologia para serem conduzidos a seu destino, contando apenas com a habilidade do saveirista para manobrar a força do vento.