A Idade Média, mais do que qualquer outra época, nos parece marcada pelas suas brancas roupagens de igrejas repletas de esculturas, mosaicos ou vitrais multicolores, , marfins esculpidos, enormes portas de bronze, pinturas murais, tapeçarias, etc. Mas, em toda essa fascinante profusão e variedade de produtos artísticos, podemos reunir um número restrito de artistas e, ainda por cima, nomes isolados, ligados a uma única obra.
A crise do mundo antigo comportou graves perturbações na estrutura do mundo artístico e na posição dos seus componentes. Desapareceram ricos e requintados colecionadores, a produção diminuiu ao ponto de cessar em centros artísticos que tinham sido importantes e, em outros, continuou mas em escala bastante reduzida. As imagens suscitavam graves suspeitas e hostilidades, na medida em que estavam tradicionalmente associadas ao mundo e à cultura dos gentios e, por isso, eram possíveis veículos de idolatria. Foram cada vez mais colocadas ao serviço da Igreja, da sua missão e dos programas de redenção e salvação e puderam até ser consideradas como um substituto da leitura para os iletrados.
De modo geral, durante muito tempo na Idade Média, o sinal de inferioridade que marcava quem praticava os trabalhos manuais, ao contrário de quem exercia atividades intelectuais, continuou a ser um fator discriminatório. Essa visão predominou pelo menos até ao século XII, quando a estrutura cultural, agitada pelo impetuoso crescimento das cidades e pelas modificações sociais e mentais que esse crescimento implicava, entrou em crise.
No interior do campo artístico existiam distinções hierárquicas muito acentuadas: o arquiteto, em cuja obra se reconhecia uma componente projetual (portanto, mental) e organizativa, era especialmente apreciado. Mas a ideia que, na Idade Média, se tinha do arquiteto era muito variada. Além dos arquitetos, a posição dos ourives, que trabalhavam as matérias mais preciosas, e dos mestres vidreiros, peritos numa técnica difícil, era elevada.
Nas fontes, há rasgados elogios a certos pintores que eram procurados, em Itália, pelo seu talento, como Johannes, que Otão III chamou à Aquitânia, ou o lombardo Nivardus, pintor de muito talento, chamado a trabalhar no mosteiro de Fleury (Saint-Benoít-sur-Loire) pelo abade Gauzlinus, filho ilegítimo de Hugo Capeto e generoso comitente.
Antiguidade Clássica
Após a Antiguidade Clássica, uma das primeiras biografias de artistas é a de Santo Elói (588-660), o famoso ourives e moedeiro do Limoges (França) que se tornou personagem importantíssima da corte merovíngia. Ao biógrafo não interessava de um modo especial a atividade artística de Elói, que era apenas um dos aspectos da sua personalidade, a par de outros não menos — e para o biógrafo, mais — importantes
Em 1148, o abade Wibaldus de Stavelot escreveu a um ourives cujo nome começava por G e que, provavelmente, seria o famoso Godefroy de Huy, também chamado Godefroy de Claire. Escreveu o bispo: «Os homens da tua arte têm, por vezes, o hábito de não cumprir as promessas porque aceitam mais trabalhos do que os que podem executar. A ganância é a mãe de todos os males, mas o teu nobre engenho e as tuas mãos diligentes e hábeis escapam a qualquer suspeita de falsidade. Simplesmente pedir-te que te dediques exclusivamente aos trabalhos que te encomendamos e recuses qualquer outra tarefa que possa prejudicá-los, até estarem concluídos.”
São conhecidos também os nomes e as imagens de um certo número de miniaturistas do período românico. Mas o lugar mais importante e de maior prestígio social no interior de um «scriptorium» é o do «scriptor», o copista. o seu trabalho é considerado mais elevado e intelectual do que o trabalho manual do pintor: copistas das palavras divinas, dos escritos dos santos, sobre eles se reflete a luz do Verbo.
O aparecimento das assinaturas dos artistas está relacionado com as grandes iniciativas artísticas e edificantes das comunas: o fato de se ter conseguido os melhores artífices e de se ter realizado, graças a eles, as mais extraordinárias construções é um orgulho para a coletividade e aumenta o prestígio das cidades. As inscrições com os nomes dos artistas abundam, no decorrer do século XIII, especialmente em Itália, mas também em França e na Alemanha, embora com relevância e características diferentes.
Wiligelmo foi escultor e Niccolò também. Michele delia Chiusa, Niccolò dirige – se ao público, convidando – o a admirar o emaranhado de plantas por ele esculpido e onde se escondem feras e monstros e a compreender o significado da sua obra, observando as imagens e lendo as inscrições. Uma inscrição existente na catedral de Ferrara confirma o talento de Niccolò e augura – lhe glória eterna.
Construção na Idade Média
O seu papel num grande estaleiro era diferente do do canteiro ou do pedreiro, já que era ele quem projetava e coordenava as atividades dos vários grupos de operários e dos vários artistas : escultores, pintores, mestres vidreiros, ourives, ferreiros, carpinteiros, etc. A partir dos primeiros decênios do século XIII, conhecemos muitos dos arquitetos que dirigiram os trabalhos das grandes construções góticas : por exemplo, Robert de Luzarches e, depois, Thomas de Courmont, em Amiens, Jean e Pierre Deschamps, em Clermont – Ferrand.
Guillaume de Sens iniciou bastante precocemente ( 1178 ) a construção, no novo estilo, do coro da catedral de Cantuária, Etienne de Bonneuil é chamado à Suécia, em 1287, para trabalhar na catedral de Upsala e, por volta de 1270, a reconstrução, em « opere francigeno », segundo as regras do estilo gótico, da igreja de Wimpfen im Tal, na Floresta Negra, foi confiada a um « peritissimo architectoriae artis latomo » ido de Paris
A libertação parcial dos artistas da situação subalterna em que a sua relação com as artes mecânicas os colocava, teve em a Divina Comédia um dos seus momentos mais privilegiados e encontrou na cultura florentina o espaço no qual esse acontecimento pôde verificar – se. Por um lado, há o peso das palavras de Dante ; por outro, o peso da arte profundamente inovadora de Giotto, em redor do qual depressa se criou uma rede de cumplicidades e de admiração.
Numa das novelas do Decameron que tem Giotto como protagonista, Boccacio afirma que « tendo ele essa arte que volt à luz do dia, que durante muitos séculos, pelos erros de alguns que sabem mais deleitar os olhos dos ignorantes do que deliciarem a inteligência dos sábios, tinha estado sepultada, pode merecidamente dizer – se que é uma das glórias do esplendor florentino » e Petrarca, que, em 1370, deixou em testamento um quadro de Giotto ao senhor de Pádua, observa que a beleza desse quadro, não compreendida pelos ignorantes, maravilhava os mestres
A discriminação entre doutos e ignorantes fez com que as artes figurativas se aproximassem da dignidade das artes liberais, depois de um longo esforço de autolegitimação que os artistas tinham levado por diante, realçando, nas suas assinaturas, o caráter erudito, não mecânico, mas intelectual, da sua forma de trabalhar.