É fundamental que os alunos compreendam bem os conceitos, técnicas e algoritmos que envolvem a operação de divisão para alcançar um resultado efetivo no processo de aprendizagem; além disso, os professores devem possuir em sua formação a fundamentação correta dos conceitos inerentes apresentadas no estudo da Aritmética. Nesse sentido apresentaremos uma proposta de intervenção no ensino de divisão tendo em vista os documentos oficiais e materiais didáticos. Utilizamos como metodologia a pesquisa documental a fim de analisar as teorias que fundamentam o conceito de divisão, investigar esse conceito na educação básica e realizar uma proposta didática para o ensino de divisão baseada na Teoria dos Campos Conceituais de Vergnaud.
Palavras-chave: Divisão; Ensino Fundamental; Matemática.
Introdução
As operações com números do sistema decimal fazem parte da Aritmética subárea da matemática que segundo Onuchic e Botta (1998, p. 19) “é a parte da matemática que trabalha sobre números, estabelecendo relações, definindo operações e identificando propriedades”. Neste sentido, para o ensino dessas operações os professores da educação básica necessitam dominar os conceitos, teoremas e propriedades estudados pela área em que esse conteúdo está situado.
Dessa forma, buscamos compreender os conteúdos e conceitos matemáticos que fazem parte do currículo da educação básica, especificamente, do 6º ano do ensino fundamental. Neste sentido, selecionamos como fins de pesquisa o conceito de divisão, operação básica trabalhada desde a educação infantil, visto que, diante da nossa experiência no Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (PIBID), na Residência Pedagógica e no Estágio Supervisionado, percebemos que é um conteúdo que causa dúvidas em diversos alunos durante o processo de aprendizagem.
Isto posto, pensando nas dificuldades encontradas durante nossas experiências, propomos uma atividade, para que os professores consigam juntamente com os alunos, analisar os conceitos da divisão e assim despertar na turma questionamentos e uma visão crítica desse conceito matemático.
Divisão na Educação Básica e nos livros didáticos
A divisão, no fundamental II, é tratada em dois sentidos principais: a de equipartição e de medida, ou ainda, segundo Onuchic e Botta (1998, p. 23) divisão partitiva e divisão quotitiva. No sentido de equipartição, o dividendo é uma grandeza qualquer e o divisor é um número natural não nulo. Em contrapartida, ao trabalharmos a divisão com o sentido de medida encontramos o divisor e o dividendo sendo, ambos, grandezas de mesma natureza, e queremos identificar quantas vezes o “divisor cabe no dividendo”. Nos exemplos a seguir, veremos como essas duas ideias são aplicadas em exercícios.
Exemplo 1. Joana comprou 30 bolinhas de gude. Ela quer distribuí-las igualmente em 5 caixinhas. Quantas bolinhas ela guardará em cada caixa?
Quadro 1: Solução do exemplo 1, baseada no esquema de divisão dos cadernos de apoio e aprendizagem: Matemática (6º ano) da Prefeitura de São Paulo.
Quantidade de bolinhas
Quantidade de caixas
Resto
30
Caixa 1: 6 bolinhas
0
Caixa 2: 6 bolinhas
Caixa 3: 6 bolinhas
Caixa 4: 6 bolinhas
Caixa 5: 6 bolinhas
Resposta: 30 : 5 = 6.
Exemplo 2. Joana comprou 30 bolinhas. Ela as guardou em caixas com 6 bolinhas cada. Quantas caixas ela usou?
30
6
-30
5
00
Resposta: 30 : 6 = 5
Nos exemplos apresentados anteriormente é possível identificar a diferença entre equipartição e medida, uma vez que, um visa descobrir o tamanho de cada parte e o outro, a quantidade de partes. Entretanto, se há essa diferença, é necessário entender porque ambas são equacionadas pela divisão. Neste sentido, ainda que compreenda ações cognitivas diferentes, podemos perceber que nos dois casos têm-se o todo, o tamanho de uma parte e o número de partes e é pensando nesses conceitos que se faz o uso da divisão. (CARRER; DOERING; RIPOLL, 2018) e (SOPPELSA, 2016).
No ensino fundamental, a divisão deve ser introduzida logo nos primeiros anos, de acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais (BRASIL, 1998, p. 81), mesmo que seu conceito seja dado em cima de problemas, induzindo o aluno a criar estratégias para resolvê-las.
Recomendação BNCC
Ainda assim, a BNCC (BRASIL, 2018, p. 300) recomenda que no 6º ano seja retomada as operações elementares com os números naturais, sem alusão ao resto da divisão euclidiana. A retomada do conteúdo nesse ano, também, se deve a complexidade da operação de divisão e de um novo significado, onde o divisor e o dividendo são grandezas de espécies diferentes e geram um quociente, que pode ou não ser de mesma grandeza.
O Programa Nacional do Livro e do Material Didático (PNLD) disponibiliza obras didáticas de apoio à prática educativa. Com isso, o conteúdo presente na BNCC deve ser trabalhado nos livros aprovados. Para fins de pesquisa, analisamos os seguintes livros destinados ao 6º ano: “A Conquista da Matemática”, “Praticando Matemática” e “Projeto Teláris”. O desenvolvimento do conteúdo destes livros estão de acordo com o que é proposto pela BNCC para o 6º ano.
Os livros apresentam a divisão no conjunto dos números naturais, envolvendo as ideias de dividir uma quantidade em partes iguais e quantas vezes uma quantidade cabe em outra. As coleções também apresentam meios de como identificar uma situação de divisão e começam a conceitualizar o assunto descrevendo a Relação Fundamental da Divisão. Neste sentido, os exercícios encontrados nos livros para a abordagem da divisão podem ser analisados em dois momentos:
Ideia intuitiva de divisão
O autor preocupa-se em propor questões que envolvem o cotidiano de uma pessoa, tendo em vista que a ideia intuitiva se reduz à identificação de situações que é apropriado o uso de divisão, seguidos de uma sistematização.
Relação fundamental da divisão
O autor assume que o aluno compreenda e domine o uso do algoritmo (sequência de procedimentos para realização de uma tarefa) da divisão; conheça o dividendo, divisor, quociente e resto, assuntos propostos, inicialmente, para o 4º ano pela BNCC e melhor trabalhado nos anos seguintes.
Discussão sobre o tema
A partir de experiências adquiridas em sala de aula, com a participação no Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (PIBID), Estágio Supervisionado e em atividades de iniciação à docência, observamos dois principais fatores que dificultam a compreensão dos enunciados, são eles: o uso repetitivo do algoritmo da divisão e a falta de problemas contextualizados, como também observado por Soppelsa (2016). Esses fatores fazem com que o conceito de resto seja ignorado, uma vez que o resultado esperado está no quociente. Neste sentido, Ripoll e seus colaboradores (2016) fazem uma comparação com as demais operações:
Enquanto na adição, na subtração e na multiplicação temos dois valores de entrada e obtemos apenas um terceiro valor de saída, que é o resultado da operação, a divisão com naturais envolve dois valores como resultado: o quociente e o resto. (RIPOLL et al, 2016, p. 104).
Quanto ao ensino da operação de divisão, a prática pedagógica do professor na educação básica é constantemente voltada para o uso do algoritmo da divisão, visto que é considerado por muitos professores como o único meio de solucionar uma divisão, pois o uso correto dele passa a ser a maneira de avaliar a compreensão do aluno sobre a operação matemática.
O uso de algoritmos visa à resolução de problemas de forma mais rápida e direta se comparado a outros procedimentos. Em contraponto, percebemos que os alunos passam a resolver problemas de divisão de forma tecnicista sem que haja reflexão acerca do que foi feito e sem compreender o conceito (partição e quotição) que está envolvido na operação. Neste sentido, outro ponto a ser questionado, quanto ao ensino da divisão no ensino fundamental, é o fato do algoritmo ser usado de forma isolada de seu contexto, ou seja, com técnicas e métodos de resolução, dificultando, assim, o entendimento dos alunos sobre o conceito da divisão.
Tendo em vista os pontos apresentados anteriormente, consideramos que uma abordagem mais adequada para os exercícios envolvendo a divisão euclidiana pode ser fundamentado como no exemplo a seguir, proposto por Carrer, Doering e Ripoll (2018, p. 27-28).
Exemplo: A professora Queridinha, que trabalha no EMEF Madre Felicidade, levou 222 balas para serem distribuídas igualmente entre os 12 alunos de sua turma. Logo os alunos se mobilizaram para ajudar a fazer a distribuição. Surgiram diferentes propostas:
Joãozinho propôs que cada aluno recebesse 17 balas;
Cláudia sugeriu que cada aluno recebesse 16 balas;
Fernando propôs que cada aluno recebesse 15 balas;
Mariana propôs que cada aluno recebesse 19 balas;
As propostas acima distribuem as balas em partes iguais entre os 12 alunos da turma?
As propostas acima são todas possíveis/viáveis?
Quantas balas sobrarão na distribuição feita por Joãozinho, Cláudia, Fernando e Mariana?
Qual a sua proposta de divisão das 222 balas entre os 12 alunos dessa turma?
A sua proposta é melhor que as demais? Em que ela se diferencia das demais? E por que essa diferença é importante, na sua opinião?
O exercício anterior é um exemplo de como trabalhar a Divisão Euclidiana de forma que as questões levantadas não visem somente um resultado ao qual é obtido através do algoritmo, mas possibilitar que o aluno seja capaz de avaliar e decidir, dentre as alternativas, a que otimiza o processo de resolução do problema.
Considerações Finais
O conhecimento matemático torna-se decisivo para que o professor saiba nortear a prática pedagógica, visto que, tendo propriedade dos conceitos envolvidos é possível trabalhar com os diferentes processos que envolvem as operações com números naturais, uma vez que apresentando variadas formas de resolução de uma situação-problema que envolve esses conceitos, possivelmente o processo de aprendizagem do aluno tornar-se-á mais efetivo, pois diante das diversas formas de resolução o aluno poderá observar o que está sendo proposto e compreender os significados das numerações envolvidas no problema. No que diz respeito à operação de divisão, o aluno poderá compreender o significado dos números que correspondem ao dividendo, divisor, quociente e resto.
Além disso, para que as situações-problemas sejam solucionadas, o conhecimento matemático e as habilidades de resolução de problemas devem estar sempre em conjunto, pois de acordo com a teoria dos campos conceituais de Vergnaud, os alunos precisam estar aptos para compreender as situações, identificar os dados envolvidos, organizá-los, elaborar estratégias de resolução e verificação das respostas encontradas.
Acreditamos que a abordagem como no exemplo proposto poderá sanar algumas dificuldades e solucionar confusões realizadas pelos alunos no processo de realização da divisão, visto que, ainda que sejam apresentadas técnicas, objetivamos com a atividade propor uma reflexão em torno dos dados envolvidos na situação-problema.