1. INTRODUÇÃO
A partir do momento em que nascemos, todas as superfícies do nosso corpo são colonizadas por uma vasta gama de espécies microbianas, conhecidas coletivamente como microbiota. Os micróbios são passados verticalmente de mãe para filho durante o nascimento e, posteriormente, são obtidos por transferência horizontal do ambiente. Quando chegamos à idade adulta, já abrigamos trilhões de células microbianas que representam milhares de espécies de bactérias, além de fungos, arqueias e vírus. A composição precisa de nossa microbiota é moldada por fatores ambientais que resultam em repertórios microbianos tão únicos para o indivíduo quanto nossas impressões digitais. Nossos micróbios comensais são mais do que meros passageiros silenciosos que habitam nossas superfícies corporais; eles desempenham papéis essenciais no desenvolvimento e função imune, metabolismo, fisiologia e até função cerebral (MCCOY e THOMSON, 2018, p. 2519). A grande maioria da microbiota está localizada no trato gastrointestinal, mas locais como a pele ou a cavidade oral também hospeda uma grande quantidade de micróbios (KHOSRAVI et al. 2014).
Foi demonstrado que bactérias intestinais específicas ou produtos bacterianos suprimem a inflamação intestinal (por exemplo, colite) em camundongos através de uma variedade de mecanismos imunológicos (ATARASHI et al., 2013, RODADA e MAZMANIANA, 2010, SMITH et al., 2013). Além disso, o impacto dos micróbios comensais nas respostas imunes do hospedeiro não se limita às interfaces da mucosa, mas se estende aos compartimentos sistêmicos; os micróbios intestinais regulam as respostas imunes que influenciam a autoimunidade específica de órgão em modelos animais de esclerose múltipla, artrite reumatoide e diabetes tipo 1 (LEE et al., 2011, MARKLE et al., 2013, WU et al., 2010). Embora numerosos exemplos ilustrem como a microbiota contribui para a função imune nos locais mucoso e sistêmico, pouco se sabe sobre as influências das bactérias intestinais no desenvolvimento celular nos tecidos imunes primários.
O sistema imunológico começa a se desenvolver no útero, mas a maturação completa requer sinais genéticos e ambientais que moldam ainda mais a imunidade após o nascimento. As células linfoides e mieloides desenvolvem-se amplamente a partir de células-tronco hematopoiéticas (HSCs) nos tecidos primários, onde sinais moleculares orquestram a diferenciação de células imunes de HSCs não comprometidos e células progenitoras via regulação de fatores de transcrição e modificações epigenéticas (WEISSMAN, 1994). Além disso, certas populações de fagócitos (incluindo células de Langerhans e microglia), derivadas de precursores embrionários, são mantidas independentemente dos HSCs (SIEWEKE e ALLEN, 2013).
Contribuições genéticas (isto é, pistas moleculares codificadas pelo genoma hospedeiro) para as vias de comprometimento da linhagem que controlam o repertório mieloide são bem estudadas (GEORGOPOULOS, 2002). No entanto, fatores ambientais que influenciam a hematopoiese não foram amplamente definidos. Com base em dados emergentes que mostram que a microbiota representa um fator ambiental integral na formação de inúmeras características do sistema imunológico, conclui-se que as bactérias intestinais podem estar controlando a imunidade central (KHOSRAVI et al. 2014). Foi observado que o uso indiscriminado de antibióticos causa uma disbiose induzida da microbiota levando a alterações nas linhagens hematopoiéticas, com a supressão de progenitores multipotentes (JOSEFSDOTTIR, 2017). Os micróbios comensais promovem a manutenção de células mieloides derivadas de HSC e embriões durante condições de estado estacionário. A ausência de micróbios comensais leva a defeitos em várias populações de células imunes inatas (incluindo neutrófilos, monócitos e macrófagos) em locais sistêmicos (KHOSRAVI et al. 2014).